Obras decorrentes de histórias ou histórias decorrentes de obras. As narrativas são uma forma de desenho que usa como suporte o tempo imaginado e apresenta no tempo vivido um testemunho ou uma cena que comprova aquela história.
Laminadas Almas é uma investigação sobre a metamorfose. Dois portais de madeira preenchido por dezenas de laminas de vidro, engavetadas horizontalmente e verticalmente estão próximos a ponto de algumas laminas horizontais de um se confundir com as laminas do outro. Nesta intercessão, onde seria o eixo da obra, pende do teto uma forte lâmpada incandescente. Duas mesas se aproximam, ocupando posições simétricas. Em baixo de cada uma delas existe um aquário, com as mesmas dimensões do tampo da mesa, repleto de girinos. Por sobre o tampo da mesa algo parecido com terra está espalhado ocultando milhares de larvas de mosca que se movem escondendo-se da luz. Lâminas de laboratório se espalham entre as larvas. Dois grandes alfinetes cravados na parede, se alongam até os portais, apoiando-se neles. Sua longa superfície de alumínio polido serve de varal para dois viveiros, um de moscas e o outro de rãs. Assim como as mesas, os viveiros estão em posições simétricas. O viveiro de moscas é construído com laminas de vidro na posição vertical e o viveiro de rãs com laminas de vidro na posição horizontal.
Laminadas Almas foi montada três vezes, em três momentos diferentes. As variações dispunham ora da participação de performers, ora da participação de bailarinos, ora de variações de posicionamento entre alfinetes e viveiros. As três montagens estão registradas em livro editado pela Holzwarth Publication
O trabalho inaugurado em 24 de setembro, 2004 na Galeria Millan. Tunga convidou Thiago e Matheus Rocha Pitta, jovens artistas que por acaso são gêmeos, para fazerem o papel dos cientistas. Sua semelhança produziu um efeito surpreendente de espelho, seu balé tornou-se uma espécie de círculo vicioso; durante o primeiro ensaio da performance, para que eles pudessem descansar, Tunga e seu assistente Fernando atuaram como substitutos. Os olhos arregalados de Tunga adaptavam-se alternativamente ao habitat do sapo ou ao das moscas e Fernando fixava-se no movimento incessante das moscas e dos sapos, absorvido em sua observação científica, uma encarnação da intensidade e da calma, enquanto as sombras das moscas em seu avental branco sugeriam milhares de almas histéricas, Almas laminadas.
Quando Almas laminadas foi apresentada no Jardim Botânico no Rio de Janeiro em 20 de maio de 2006, tinha evoluído para um trabalho mais estruturado, distribuído entre uma sala central para o laboratório e duas salas laterais, numa as gigantescas peles de sapo, luminárias, luvas de quatro dedos, e na outra uma disposição mais semelhante a escultura com grupos desses elementos em mesas distintas. Estudantes de biologia em jalecos brancos pareciam estar incitando os espectadores a se juntar aos homens e mulheres nus, os dançarinos levados pela coreógrafa Lia Rodrigues. Percebíamos o trabalho oscilando entre o macro e o micro. Não só na variação das dimensões das lâminas mas também no som que captava e reproduzia as vozes humanas que enchiam a sala e o som amplificado de dentro dos viveiros das moscas.
A metamorfose presente neste trabalho inspirou Tunga em seus trabalhos seguintes com cristais. Matéria transmutada ou em processo de mutação que muitas vezes foram representadas por vidros e ímãs e até pelo misterioso rubi de Ser te amavi. A rã beija/morde a mosca. Como na conexão em “Love me knot” onde voltamos a fazer a pergunta: como é possível construir um toro? A primeira resposta é pelo beijo/mordida – o ato de criar um corpo contínuo a partir de dois corpos.